Como estar na moda sem disfarçar as gordurinhas?

Adele fará parte do processo de criação da nova coleção da marca britânica Burbery. O diretor da marca, Christopher Beiley fez questão de convidá-la pessoalmente para trabalhar ao seu lado em uma linha “sob medida” dedicada às clientes “plus size”. Será que a moda está se abrindo para as mais cheinhas? Tenho certa desconfiança em relação a isso, mas confesso que estou curiosa para ver o resultado dessa parceria.

Lembro que há pouco tempo tive contato com uma consultora de moda e todas as dicas que ela dava sobre as vestimentas se resumia a disfarçar e esconder as gordurinhas. Listras verticais, cores escuras ou cortes retos era algumas das dicas para alongar a silhueta e ficar “linda” com o look. Confesso que me senti extremamente incomodada com as “dicas” e perguntei se a moda realmente estava se democratizando ou simplesmente reforçando o preconceito contra o corpo gordo. Afinal de contas, todo o discurso da moda em relação ao tamanho “GG” se resume a camuflá-lo. Ela veio com todo um discurso sobre a aceitação como se a questão fosse simplesmente minha e a indústria da moda não tivesse nenhuma relação com isso.

Recentemente, os Estados Unidos apontaram uma pesquisa mostrando que as meninas veem mais de 400 anúncios, por dia, dizendo-lhes como elas devem ser! Não sei se algum estudo semelhante já foi realizado no Brasil, mas as imagens de mulheres nas revistas, propagandas e na TV brasileira reforçam uma concepção cultural sobre o corpo feminino, que inclui normas rigidas de beleza, modelos de saúde e regras de comportamento que controlam constantemente as nossas medidas. Dessa forma,  as características atribuídas a  “mulher ideal”  funcionam como uma ordem disciplinadora dos corpos, oferecendo regulamentos práticos para que o corpo seja treinado, moldado e construido a imagem e semelhança das “musas” da midia.

Pertencer (ou não) ao clube das Gostosas define nosso valor social. Por isso, se vc não está dentro dos padrões de beleza, precisa atacar de ilusionista e fingir que é magra, seja se espremendo dentro de uma cinta maldita, seja consumindo a moda que esconde. Confesso que ainda procuro disfarçar meus pneuzinhos e não advogo em favor da adiposidade explicita. Mas, o que não podemos aceitar é uma indústria de moda que favorece a rejeição dos nossos corpos. Que nos leva a ter raiva e vergonha das nossas diferenças. Que nos faz odiá-las. Por isso, gostaria de ver algo realmente novo nesse mercado: uma moda que aceite os nossos próprios limites e que nos dê a possibilidade de tomar decisões inteligentes sobre como vestimos e como queremos nos apresentar socialmente. Trata-se de defender a privacidade dessas escolhas. De promover a idéia de que qualquer coisa que você faz com seu corpo deve vir do cuidado de si e do amor próprio, não da culpa, do julgamento ou da punição. Trata-se de exigir respeito e representatividade, não importa a aparência, a idade ou o tamanho. Essa é a moda que eu gostaria de ver. Para todos nós.

5 Comentários (+adicionar seu?)

  1. Ana
    set 21, 2012 @ 13:59:52

    Vejo um grande problema que está por trás desta cultura magra. Negar os corpos arredondados é também uma forma de negar o prazer de comer, de se esbaldar com as escolhas estéticas e saborosas dos alimentos, de experimentações à mesa, à cama, e a outros prazeres com o corpo, como atividades físicas ao ar livre ou em espaços mais lúdicos e menos, digamos, industrializados do que as culturalmente fatigantes academias de ginástica, em que você tem a opção de repetir movimentos à exaustão ou imitar passos (isso é dança?) num ritmo frenético e ao som de músicas alienantes.
    E o terrorismo da saúde por trás disso, como se só tivesse saúde quem comesse frango grelhado e salada (com pouco azeite!) todos os dias e malhasse loucamente. O conceito de saúde, que é mais abrangente que isso, considera o nosso corpo emocional e tudo o que há nele.
    Confiar em nossos corpos é confiar nos desejos que ele traz à mesa, e nos desejos que eles nos colocam em relação aos movimentos do corpo. Se esses nossos desejos não cabem no padrão do que tem por aí, e, por conseguinte, não cabemos na calça 38, nos julgamos inapropriadas ou pouco bonitas.

    A indústria da moda, como toda indústria capitalista, joga com a exclusão, valorizando aquilo que nem todo mundo pode ter, mesmo que isso seja um modelo do próprio corpo.

    Agora, parece, descobrem um novo “mercado”. Vamos ver no que vai dar.

    E não mencionei o viés machista da cultura magra, que impõe padrões de consumo (de moda, de alimento, de exercícios, de maquiagem, de comportamento) às mulheres, diretamente relacionadas aos seus corpos e à percepção deles, mas não faz o mesmo com os homens, nem de longe!

    E, como adoro finais panfletários, aí vai: pelo fim da ditadura da magreza! Pela liberdade de expressão em todos os sentidos! Que o sabor esteja sempre em nossas vidas, na cama, na mesa, no trabalho, nas ruas, em casa!

    Bia, amei a provocação, como sempre!

    Beiju!

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  2. abbsaraiva
    set 21, 2012 @ 17:39:24

    Aninha, adoro as suas colocações. Isso mesmo. O mercado descobriu um novo filão, não quer dizer que o aceite. Ela vende para esse público, com o objetivo de dizer: descobrimos como te esconder através das roupas. Por isso, apoio a causa: “pelo fim da ditadura da magreza! Que o sabor esteja sempre em nossas vidas, na cama, na mesa, no trabalho, nas ruas, em casa!” Bjo grande, querida!

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  3. Aramis
    set 25, 2012 @ 17:51:52

    Oi Bia e Ana. Escrevo para registrar que acompanho o blog quando posso. Inclusive os comentários, particularmente da Ana. Acho essa experiência da escrita & discussão bem bacana. Como conheço as duas, sei que isso tudo faz parte de faz parte uma espécie de terapia do corpo, do movimento de construí-lo. Dos poréns, só um incômodo a ser registrado: o uso abusado das prosopopeias. Não como figura de linguagem, mas como muleta do pensamento. Fazer do mercado, capitalismo ou tralalá de vilão talvez seja uma escapatória para não encarar a ação do biopoder. O ódio eficaz ao corpo gordo, magro, preto, branquelo, homossexual, pardo, torto, faltoso ou tralalá surge dos próprios poros dos corpos negados. Corpos tecidos sim nas pranchetas dos designers, nos púlpitos dos padres, nas salas de aula da universidade, nos colos das maes. Prosopopeias têm força no mito. Nao na descricao da lógica do poder.

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    • abbsaraiva
      set 26, 2012 @ 11:55:57

      Baby, interessante levantar essa questão. O ódio a tudo que não está no padrão está de tal maneira ancorada em nosso inconsciente que não percebemos mais o efeito que ele causa em nós mesmos. Realmente, é uma ação que vai além simplesmente do mercado, do capitalismo ou de qualquer outro vilão da História, porque é é uma forma de “violência suave, invisível a suas próprias vítimas, que se exerce essencialmente pelas vias simbólicas”, como lembra Bourdieu na “dominação masculina” e que serve para esse caso. Ele é introjetado, subjetivado e está “na ordem das coisas”. Por isso, a necessidade de começar a desnaturalizar certos conceitos de beleza, saúde e “normalidade”. O objetivo é fazer parte da produção de novos sentidos para o corpo e para si mesmo.

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  4. Ana
    set 27, 2012 @ 13:57:06

    Oi Aramis, gostei do seu comentário, me fez pensar sim na intenalização dos preconceitos, mas não sei se entendi tudo. Acho que o ódio, como tudo na vida, é ensinado. Me parece que uma criança vivenciará sentimentos de perda, de dor e abandono e os expressará como raiva. Mas a mediação que pode tornar isso um ódio consciente (a si e aos outros) passa por um entendimento valorativo, o que é bom, belo, e o que é ruim, feio. Essa mediação é do mundo dos adultos, em que os códigos estéticos e éticos são trocados. E acho sim que nessa troca tem gente que tem mais poder para persuadir os demais do que é belo e bom e do que é ruim e feio. A mídia não é o mundo e a vida (graças!), mas, puxa, joga um papel importante, eu acho. Beijo e obrigada pela reflexão. Aliás, achei você tão bonito outro dia! =)

    Responder

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